Marco civil da internet: entre a liberdade e a lógica do lucro

Editorial do sítio Vermelho:

 O que está em jogo na votação do marco civil da internet, que foi novamente jogada para diante, é o caráter da rede: ela será, como se apregoa, um campo de livre debate e circulação de ideias e informações, ou uma espécie de extensão das empresas gigantes de comunicação e geradora de lucros himalaicos?


 O projeto do marco civil da internet (PL 2.126/11), que tramita na Câmara dos Deputados, tranca a pauta desde o dia 28 de outubro, impedindo a votação de outros projetos urgentes, como o que elimina o fator previdenciário. 

 A paralisação resulta do autêntico braço de ferro que ocorre entre o lobby das grandes empresas que atuam no setor, de um lado, e os representantes da sociedade civil, usuários, pesquisadores e comunicadores, de outro.

 O ponto principal da divergência diz respeito à chamada neutralidade da rede. O artigo 9º do PL 2.126/11 define a neutralidade afirmando a obrigatória igualdade de tratamento para todos os dados que circulem pela internet. Ele diz: o responsável pela “transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço terminal ou aplicativo”. Mas deixa uma brecha que, se aprovada, beneficiará os grandes monopólios. Embora o texto proíba “qualquer discriminação ou degradação do tráfego que não decorra de requisitos técnicos necessários à prestação adequada dos serviços”, a brecha legal está nas palavras que concluem o texto: “conforme regulamentação".

 Isto é, diz que caberá à Anatel regular a aplicação da lei e sua compreensão mais completa. Ora, a agência não tem esta definição constitucional, mas, mesmo assim, acabaria absorvendo uma atividade que, hoje, é exercida pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), que tem se caracterizado por uma ação independente e autônoma em relação às grandes empresas e por respeitar os interesses dos usuários da internet e a liberdade da rede. O CGI.br é um organismo vinculado ao Ministério das Comunicações, com a participação de representantes do governo, empresas, usuários, academia e terceiro setor. E tem um poder regulatório que as grandes empresas querem destruir. 

 A pressão na Câmara dos Deputados é grande, e pode haver uma manobra em curso, fomentada pelo lobby das grandes empresas que, se tiver êxito, pode empurrar a votação do marco civil da internet para o próximo ano. Faz parte dessa manobra a possibilidade de derrotar em plenário o relatório do deputado Alessandro Molon (PT/RJ), que consagra princípios democráticos. 

 A votação do marco civil da internet opõe interesses financeiros e políticos gigantescos. Opõe a ganância das grandes empresas e seu objetivo de colocar um cabresto na internet, reduzindo-a a mais um instrumento de seus lucros cada vez maiores, à imensa maioria dos militantes, comunicadores, pesquisadores e jornalistas, que veem na internet um campo para o exercício da liberdade de expressão e comunicação. 

 A deputada comunista Luciana Santos manifestou-se em defesa da garantir a consolidação ao afirmar que “seremos vanguarda no mundo, na medida em que estamos elaborando um marco civil que garante direitos e deveres dos usuários e de todo um sistema de provedores e todos aqueles que garantem a infraestrutura”. Estamos diante, disse, de “um assunto urgente e contemporâneo pelo grau de vulnerabilidade que nós estamos com esse instrumento de comunicação e de informação”, em referência às denúncias de espionagem do governo dos Estados Unidos a cidadãos e autoridades brasileiras. 

 Neste sentido, defendeu o voto favorável ao relatório do deputado Alexandre Molon que, em sua opinião, faz valer a neutralidade da rede e evita que “mais um meio de comunicação sirva como instrumento a mais do mercado e da lógica do lucro. Não podemos permitir isso”, enfatizou.

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